Uma das primeiras lembranças que tenho do meu começo na área de Segurança e Saúde do Trabalho diz respeito ao dia em que conheci um colega que sabia de cor toda a legislação. Fiquei encantado diante daquela figura. Hoje, quase 30 anos depois me lembro desta mesma figura como algo pitoresco e o que me encanta neste momento da vida profissional são as vezes que tive a oportunidade de encontrar profissionais que, além de saber a legislação, sabiam o que fazer com ela e, mais do que isso, sabiam como fazer com que outras pessoas entendessem qual a sua necessidade e utilidade.
Conheço muita gente que sabe muita coisa sobre prevenção. Infelizmente não conheço tantas pessoas que saibam transformar seu conhecimento em algo que seja de fato útil para as organizações e para os trabalhadores. É neste meio, em que o saber não chega, que se encontra boa parte dos problemas que ocorrem em nossa área.
O fato de a SST ser uma área com muitas bases legais fez e faz com que poucos sejam os profissionais que atentem para a necessidade de desenvolver habilidades para a negociação. Quase tudo fica meio restrito à ideia de que sendo obrigatório, mais cedo ou mais tarde, será feito; ou que “quando o fiscal aparecer eles vão ver o que é bom”.Esta forma de pensar desvaloriza uma das grandes habilidades que um profissional precisa ter: ser negociador.
As pessoas percebem o quanto a legislação é problemática em nosso país. Isso tem razões históricas, uma vez que os empresários quase sempre vêem a legislação como algo que gera apenas tributos e problemas, em vez de soluções e benefícios para o negócio. Eles simplesmente entendem que não precisam de qualquer coisa que venha do governo para tocar seus negócios de forma adequada e as questões de SST entram neste mesmo pacote. Até mesmo os SESMTs são percebidos desta forma e, por esta razão, surgem as tentativas de dar fim à NR 4.
Não estão distantes disso aqueles que, despidos de seu papel empresarial ou profissional, causam danos à saúde e à vida de outras pessoas. Chegando a este ponto, entende-se que as diferenças de percepção estão entre as causas primárias de conflitos e que apenas insistir em um assunto sem atuar como negociador não conduz aos resultados esperados.
É essencial, tanto para a consecução dos objetivos prevencionistas como também para a realização do profissional - que, muito mais do que apenas saber quais os parâmetros legais ou técnicos para um determinado assunto, ele, como gestor principal, aprenda e domine técnicas de negociação.
Negociação é um processo de acordo além das visões e convicções pessoais na direção de um resultado. Para que transcorra bem é preciso que elementos como flexibilidade e confiança sejam bem trabalhados. É essencial, muito mais do que saber falar bem, saber ouvir bem para perceber dificuldades alheias e remover obstáculos. A competência em negociar é hoje uma habilidade imprescindível em qualquer área de atuação.
Ser um bom negociador é algo a ser aprendido. Inicia pelo pleno conhecimento do assunto a ser tratado, do ponto de vista externo (legislação, por exemplo) e da organização. Chega até o planejamento sobre como o assunto será conduzido, incluindo uma forma que permita, ao mesmo tempo, visibilidade sobre o assunto de modo compatível com pessoas que estão sempre muito ocupadas e, também, a possibilidade de ser aprovado de forma total ou parcial. Passa pela maneira franca de tratar o assunto e chega ao objetivo de beneficiar a organização como um todo.
Pode parecer um detalhe falar sobre negociação. Mas entre o obrigatório e a realidade existe um espaço para a ação humana e a experiência mostra o quanto ela faz a diferença.
Cosmo Palásio de Moraes Júnior
- Técnico de Segurança do
Trabalho e Coordenador do egroup SESMT